sábado, 2 de fevereiro de 2008

Um pilantra renascentista


A história da música brasileira nunca teria sido a mesma sem Carlos Imperial. O "Gordo" jogou nas 11. Foi ator, cantor, compositor, produtor, apresentador de TV, disc-jóckei, jornalista, colunista, cineasta, roteirista, e o diabo a quatro.

Dos anos 50 aos 80, Imperial esteve em todas. Ajudou a lançar Roberto Carlos e Erasmo, Wilson Simonal e Fábio. Compôs e produziu músicas para Tim Maia, Elis, Clara Nunes, Jair Rodrigues, e uma miríade de artistas . Foi parceiro de Ataulfo Alves, Eduardo Araújo e outros tantos.

Era enturmado com o pessoal da Bossa Nova mas lançou o rock no Brasil e nos anos 60 criou um estilo que chamou de Pilantragem, cujo maior representante foi Wilson Simonal, ex-secretário do Gordo.

A vida de Imperial ilustra perfeitamente aquela frase famosa de Chico Science: "Diversão levada à sério". Segue um texto dele sobre a Pilantragem:



“Nascimento, mudanças e apogeu da Pilantragem”

O negócio aconteceu assim: Simonal me pediu para inventar uma nova jogada. Sugeri então em transformar o samba em compasso quaternário, pois assim o cantor ficaria mais à vontade para se mostrar. Bolamos o estilo e eu compus então a primeira música de Pilantragem: “Mamãe passou açúcar ni mim”. Peruzzi foi chamado e bolamos que, como o Iê-Iê-Iê estava na onda, o negócio tinha que ser com guitarras. Criamos então o Samba-Jovem e nós definíamos: “Batida de samba e môlho de Iê-Iê-Iê”. Aí entrou Cesar Camargo Mariano na jogada com o seu Som 3 e começou a bolar novos arranjos. Nonato Buzar, amigo antigo e compositor de música tradicional, juntou-se a mim para fazermos músicas juntos. Fizemos “Carango”, que Buzar achava horrível e deprimente. Um dia propôs-me: “Se você acha que a música é realmente sensacional e que vai dar muita grana, me dá 100 contos agora que ela fica sendo só sua”. Foi um custo para convence-lo de que o samba-jovem ia dar pé. Quando “Carango” estourou e Buzar recebeu uma grana violenta como meu parceiro, foi correndo para casa e jogou fora tôdas as músicas sertanejas e dias depois veio a safra de “Uni-du-ni-tê”, “Vesti azul”, etc.

Eu, Simonal e Cesar Mariano trabalhávamos juntos na TV Record e a palavra que mais usávamos era Pilantragem. Tudo era Pilantragem e resolvemos oficializar a mudança do Samba-Jovem para Pilantragem. Eu compus então, “Nem vem que não tem”, cuja letra define bem o sentido da Pilantragem. Cesar Mariano fêz os arranjos (Toninho na Bateria e Sabá de Baixo para dar o môlho) e Simonal gravou como se estivesse tomando banho: completamente à vontade. No início da música, Simonal, com aquela voz de Pila (falar com os lábios fazendo bico) disse: “Vamos voltar à Pilantragem”. Estava definitivamente lançada a Pilantragem como música, arranjo e filosofia (veja letra de “Nem vem que não tem”).

Pilantragem é a apoteose da irresponsabilidade consciente.


*Texto retirado da contracapa do disco “Pilantrália

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